Thursday, December 13, 2007

Animais na rua???

Decepcionante hoje ler a coluna do Carlos Chagas, na Tribuna da Imprensa. Para o final do ano, o governo costuma dar liberdade condicional a vários presos, dependendo do tipo de crime, do tempo de pena cumprido e de bom comportamento. Esse ano há uma proposta de libertar um número maior de presos que o normal. A regra seria dar liberdade condicional a presos que tenham cumprido mais de um terço da pena, que não pode ser maior que 8 anos.

Concordo com o jornalista que essa atitude é temerária, e que devemos discutir o assunto. Entretanto, chamar essas pessoas de animais é um péssimo começo, e já deixa claro que ele, o Carlos Chagas, não está a fim de discutir nada. O sistema carcerário brasileiro era caótico há vinte anos atrás, hoje é muito pior. O Estado não investe o suficiente em segurança porque a população não enxerga os benefícios, e o trabalho de hoje daquele jornalista não contribui em nada para esclarecer o assunto. Pelo contrário, tende a polarizar opiniões e divergir o foco das atenções para conseqüências do problemas, ao invés das causas do mesmo. Carlos Chagas culpa o governo pelo problema, como se fosse restrito a uma suposta complacência do presidente Lula.

Ele usa uma estratégia muito comum, mas quase infantil, para convencer o leitor de seu argumento. Ele cita o caso de um casal que teria violentado e matado uma criança, condenado a 60 anos de prisão, e que poderia ser libertado. "O problema é que, estando detidos há quatro anos, logo os dois estarão se valendo da tal progressão da pena". Deliberadamente o jornalista deixa a entender que esses dois criminosos poderiam ser soltos, talvez esse ano, mas isso não tem nada de verdadeiro. Crimes ediondos não são incluídos.

Dá para entender como um jornalista chega a esse ponto, de usar estratégias no mínimo questináveis, para forçar suas idéias no público leitor: infelizmente, a maior parte dos leitores é totalmente irresponsável ao tomar suas conclusões. Na verdade, não tiram conclusão nenhuma, somente tomam como suas as opiniões alheias, principalmente de jornalistas. Esses jornalistas, entretanto, possuem suas técnicas para enfatizar dados fracos, distorcer a verdade a seu favor, ocultar os fatos menos importantes, ornamentar inutilidades... e toda essa "competência", às vezes, está a serviço de valores pouco respeitáveis. Tendo que vender cada texto para ganhar o pão, portanto, requer que o jornalista ache um balanço entre o que quer o leitor, o que manda o patrão, e o que ele próprio acredita como verdadeiro, ou "julga" correto, na pior das hipóteses.

Fica claro como essa luta diária só tende a reduzir a importância do que é verdadeiro ou moral, e a cada dia a realidade vai se curvando a interesses maiores. Claro que uma parcela muito pequena faz isso conscientemente: trata-se de um processo psicológico de auto-convencimento e negação que requer tempo, além de uma formação ética instável. Mas ao final da linha, começamos a chamar seres humanos de animais, e a reduzir problemas da sociedade a duas linhas de ataque político, como fez Carlos Chagas hoje. E não é fácil sair desse ciclo vicioso, talvez nem seja possível. Talvez requeira acompanhamento psicológico ou, quem diria, religioso...

Mas o fato mais interessante disso tudo é que, com essa crise no sistema carcerário, o prefeito de Juiz de Fora posou de defensor popular ao negar ao Governo Federal construção de um presídio na cidade
. O prefeito (mentiroso, de acordo com o jornal panorama de ontem e de hoje) parece saber o que a população quer, ou melhor não quer. Farinha pouca, meu feijão primeiro. Podem colocar todos os criminosos num incinerados que eu não ligo, pois não sou um deles. Aí outros dizem que devíamos fechar o Senado e a Câmara, pois só nos trazem vergonha e decepção (Talvez um dia nos tragam alegrias, como disse ontem o senador Tião Viana). E com o Judiciário do jeito que está, logo não fará (se é que ainda faz) diferença ser criminoso ou não. Nesse caso o inferno é o outro: só entendemos o problema quando admitimos ser parte dele, e, então, começamos a tomar responsabilidade. O problema criminal no Brasil, e em qualquer outra sociedade, só tem chances de ser minimizado quando a comunidade como um todo assume suas responsabilidades. Isso, infelizmente, parece que vai demorar.

Tuesday, December 11, 2007

FHC era mais bem preparado, mas Lula é melhor

"Queremos brasileiros melhor educados, e não liderados por gente que despreza a educação, a começar pela própria", disse o ex-presidente FHC na útlima convenção do PSDB.

Só que dizer "melhor" educados está errado de acordo com as regras gramaticais da língua portuguesa. Mais correto seria, por mais estranho que soe, dizer que ele quer brasileiros mais bem educados.

Claro que a gafe não passou despercebida. E claro que se fosse um erro meu não seria importante, mas sendo um ex-presidente, que sentava-se no alto de sua erudição para criticar o colega operário, o erro toma dimensões estratosféricas. Convenhamos portanto que não é de se estranhar que algum repórter tenha vindo perguntar ao ex-presidente sobre a tal gafe, e é na sua resposta que está o melhor da história:

FHC – [...]Isso aí é polêmica gramatical [risos]. É bom, polêmica é sempre bom. Se errei, peço perdão e corrijo. Mas até agora não consegui ver por que eu não posso dizer "melhor educado" em vez de "mais bem educado". Não sei. Qual é a regra? Você sabe? O que me obriga?

Nada o obriga, suponho: as regras só valem para os operários “semi-analfabetos”. Assim como só valem os mínimos (mas válidos, possivelmente) investimentos em educação que ele, o intelectual, fez.

Enfim, deixando o delicioso erro de lado, podemos analisar a mensagem que FHC tentava transmmitir. Ele diz que queremos brasileiros mais bem educados, e nisso provavelmente concordamos. Entretanto, na frase seguinte há severas controvérsias. Primeiro porque ele mistura educação com instrução e competência. Deixa a entender que somente PhDs podem ser bons governantes. O problema é que faltam dados para justificar sua hipótese. Na verdade, o PhD dele próprio não foi suficiente para salvar seus oito anos de governo, marcado pelo sucateamento das Univesidades Públicas. Segundo, nosso ex-presidente insinua que o presidente atual despreza a educação, começando pela própria. Isso é mentira, e quem quer que esteja dentro de uma instituição federal de ensino pode constatar a mudança ocorrida nos últimos seis anos de governo do operário "sortudo". Sem mencionar sua opinião repetidas vezes manifestadas em seus discursos de inauguração de escolas e universidades...

Mas, que seja, perda de tempo escrever sobre isso. Essa conversa é uma luta de classes, nada mais, nada menos. Antes fosse uma discussão em torno de princípios, mas não é. Percebe, Raul, é aí que você poderia ajudar, mas está optando por entrar na mesma política que nos trouxe até aqui. Precisamos levantar a cabeça e pensar sob uma perspectiva mais abrangente. Eu também gostaria que nosso presidente fosse em si um exemplo da importância do estudo, mas não é. Muito pelo contrário, o operário está fazendo um trabalho excelente, apoiado por mais de 60% da população, em contraste à rejeição ao ex-presidente PhD. Pouco entusiasmador, vamos concordar, mas negar a realidade não vai transformá-la.

O rei estava nu, o povo todo viu, e por isso um operário foi eleito. E não decepcionou. Mas chega de conversa hipócrita, mostre-nos as diferenças, pois as semelhanças já nos enojam.