Advogados em perigo
Não foi há muito tempo que os brasileiros recusaram, no referendo sobre o desarmamento, a desarmar-se completamente. Particularmente gostava da idéia, teria votado a favor do desarmamento, mas hoje estou mais confuso que àquela época.
Imagino que o medo tenha determinado o resultado do referendo: se a situação piorasse ainda mais, e a violência dominasse o país, apenas policiais e criminosos teriam o direito de lutar com armas de fogo, a população ficaria à mercê da justiça que, convenhamos, possui suas falhas.
O fato é que hoje em dia custa muito caro possuir um porte de arma, além de não ser para qualquer um. Dois órgãos governamentais (SINARM e SIGMA) são responsáveis pelo cadastro de armamentos em poder da população. Alguns funcionários públicos, como juízes, fiscais, promotores, e, obviamente, policiais, possuem porte de arma, por motivos que podem ser óbvios ou não.
Enquanto, por exemplo, um policial sem um revólver teria consideravelmente maiores dificuldades em intimidar um criminoso, não sei para que eles trazem seu armamento quando estão simplesmente controlando o tráfego nos cruzamentos congestionados. O promotor deve usar a arma para se proteger dos criminosos que é pago para perseguir. O juiz, espero que não use durante os tribunais como último recurso caso o tribunal não silenciar quando ele bater o martelo. Mas acaba sendo a mesma interpretação dada para o promotor.
Mas todas essas justificativas partem da prerrogativa que esses cidadãos aos quais é autorizado o porte de armas precisam dessas armas para defenderem-se. Obviamente, se precisam se defender é porque estão desprotegidos: as forças policiais não lhes fornecem a segurança necessária.
Coloque agora essa última análise no contexto social brasileiro e prometo uma surpresa: estaria um juiz ou promotor público, dentro de seus concomínios de luxo e carros blindados, mais desprotegido que um cidadão que anda pelas calçadas com 20 reais no bolso? Não concordo, mas parece ser essa a razão padrão para justificar o porte de armas para algumas fatias da sociedade civil.
A mais nova dessas camadas que reivindica o direito de andar armado são os advogados.
O projeto de Lei partiu de Carlos Lapa (PSB-PE), um dos suplentes que figurou de deputado durante janeiro: um dos suplentes que foram notados por sua habilidade em gastar tanto dinheiro público em tão pouco tempo.
Ele parte do princípio que “A advocacia sempre foi uma profissão perigo, comprovam-no os inúmeros assassínios e tentativas de morte contra os advogados.” Eu gostaria muitíssimo de comparar esses números a que ele se refere, a outras fatias da população, como pedreiros, entregadores de pizza, engenheiros, médicos... se esse argumento for suficiente para se convencer nosso apodrecido congresso a aprovar tal proposta, abrem-se precedentes para que outros setores também soicitem o mesmo tratamento, portanto.
Sugiro que comecemos por local de residência. Caso a proporção de assassinato em seu bairro for maior que aquela entre os advogados, então você poderá requerer seu porte de arma. Seria bonito ver todo mundo na favela andando de celular e revólver na cintura.
O problema é que a população poderia comprar armas legalmente e vender para os vizinhos traficantes. Depois daria queixa na polícia dizendo que foi assaltado, e a arma teria sido levada, juntamente com os seus 20 reais que tinha na carteira. É claro, entretanto, que nenhum advogado faria uma coisa dessas....
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